O TAO DO TRIATHLON

Por MAX
da Kona Bike de Curitiba
www.konabikes.com.br



Às vezes, gosto de pensar no triatlhon não como esporte, mas como arte marcial. Trata-se, afinal, de um combate constante com os próprios limites, e também contra adversários. De lutas interiores e batalhas exteriores. De lágrimas, suor e por vezes sangue. E de vida e morte, porque durante os treinos, nos matamos cada dia um pouquinho (literal e figurativamente), para depois de cada prova renascer, vitoriosos - ainda que seja por haver tentado.

Uma vez aceita essa proposição, o triatleta, enquanto praticante de arte marcial, passa a ser um guerreiro. Tem seu uniforme, que o torna parte de uma tribo, e lhe confere uma identidade perante o mundo ao seu redor; tem seu mestre, responsável por orientá-lo no caminho da natação, ciclismo e corrida; tem suas práticas diárias, que o tornam capaz de nadar, pedalar e correr mais rápido, ou mais longe, ou ainda, quando ele for um grande guerreiro, mas rápido E mais longe. Tem seus rituais, que lhe permitem ao longo do tempo nadar pedalar e correr como se nadarpedalarecorrer fosse uma coisa só. Por fim, tem suas Grandes Provas – que mesmo pequenas aos olhos dos outros, para ele serão sempre Grandes, porque envolvem superar a si e aos outros em 3 campos de batalha diferentes.

Assim era também com os Samurais do Japão feudal, que além de dominar a arte do manejo da espada e do arco e flecha, deviam ser proficientes no combate corpo a corpo. Eram, de certa forma, triatletas sem saber. Só que além da prática diária nessas três modalidades, eles exercitavam com igual dedicação a Poesia, o Arranjo Floral e a Cerimônia do Chá. E é justamente nesse ponto que o Samurai-Triatleta de ontem e o Triatleta-Samurai de hoje começam a traçar caminhos divergentes. É nesse ponto que, no meu entender, temos a grande lição a aprender.

O Samurai, na prática das artes marciais, desenvolvia a técnica e o preparo físico que tornavam seu corpo apto à luta com o inimigo externo, assim como faz o Triatleta hoje em dia sem seus treinos. Já no exercício da Poesia, do Arranjo Floral e da Cerimônia do Chá, o guerreiro japonês buscava o equilíbrio e fortalecimento do seu espírito, que o permitia melhor enfrentar e vencer seus inimigos internos. E porque ele sabia como também nós sabemos que o inimigo interno (materializado no Medo, na Insegurança, e na Arrogância, dentre outros) nos derrota antes, e com mais facilidade, que o inimigo externo, o Samurai confiava menos no poder da técnica e do preparo que na força da vontade e do espírito.

Nesse ponto, me parece que nós, Triatletas-guerreiros de hoje, temos um vazio a preencher. Algumas vezes, ganhamos (i.e. compramos) nossa faixa preta antes de aprender a lutar, e, pior, acreditamos que ela detém o segredo da vitória. Com isso, corremos o risco de virar guerreiros de desfile, preocupados em mostrar nosso equipamento, uniforme e porte físico, mas desprovidos de ética, coragem, e humildade. Corremos o risco de, na pressa de buscar a vitória, desprezar outras faces da luta – como a técnica, o tempo de aprendizado e as derrotas – que são pré-requisitos da vitória sadia. E, levados pela crença cega e dependência exagerada nos equipamentos e na tecnologia, podemos até vencer os outros, mas continuaremos sempre perdendo para nós mesmos.

Talvez a nossa chance de resgatar em nós a essência do esporte esteja em voltar um pouco às origens, e nadar bastante em águas abertas (somente de sunga) pedalar muito na estrada (com um "coração" de ferro), e correr sob sol, vento ou chuva (de calção e camisa de algodão, e um tênis qualquer). Deixar de lado, ainda que em alguns treinos somente, a crença nas promessas da alta tecnologia, e recuperar a confiança no que somos capazes de produzir sem carbono, sem vitaminas, sem hormônios, sem GPS e sem EPO. Esgotar as nossas possibilidades de melhorar sem recursos externos. E, porque não, trocar algumas horas de musculação por alguma atividade que acalme e fortaleça o espírito.

Como conseqüência, imagino que voltaríamos a nos aproximar daquele caminho trilhado pelo Samurai – o caminho que leva o Guerreiro, na busca da perfeição em sua arte, a tornar-se um indivíduo melhor.

E quem sabe, como efeito colateral, chegaríamos (guardadas sempre as devidas proporções) mais próximos daquele que deve ser o resultado mais fantástico da história do Triatlhon até hoje:

Mark Allen, 1980 – natação .50 min, ciclismo 5hs03min, corrida 3hs:30min. Total 9hs 24min. De sunga, carroção (bike pesada) e roupa de algodão.

15 comentários:

Dalton Cabral disse...

Espetacular o texto. Daqueles que nos fazem refletir sobre o que podemos melhorar e quais caminhos devemos seguir crescer enquanto "seres-humanos-triatletas".

Ciro, conheço o Max, só não sabia que ele tinha esse lado tão folisófico... e sobre o seu blog, parabéns... leio constantemente... e continue postando os treinos... pois servem de inspiração.

Anônimo disse...

Pô Ciro...bacana essa foto dos caracoles...semana passada estávamos lá pedalando...a Claudinha hoje na USP me falou que ela que te mandou...vc como endurance man que é ia gostar dessa escalada....parabens pelo blog e pelo grande desempenho nos ironmans...vamos ver se nos encontramos pelos treinos.
Pedro Altenfelder

Anônimo disse...

Adorei o texto! Muito legal você pensar assim!
Continue treinando como um Samurai!

Rodrigo R. disse...

Grande Max! Falou tudo!

simplifique disse...

Texto animal !!! A volta as origens é uma coisa que vem martelando na minha cabeça.
Ah, essa estrada é nos Andes? Tenho uma foto parecida ...

Rafael Camacho disse...

Essa foi a descricao perfeita dos triatletas ....faloww barco ciraooo

Rafael Camacho disse...

Essa redacao foi demais ..fala tudooo.falow abracooo

Anônimo disse...

è muita realidade, os novos triatletas, precisavam ler e refletir sobre esse texto......humildade! bons treinos.

Anônimo disse...

Adorei o texto do Max,,, Cirinhoooo

bjs
Bia

ciro violin disse...

A foto é do Caminho pra Portillo chama-se Caracoles.

Unknown disse...

Muito motivador.
Só lembrando que o atleta que fez esse tempo ae foi o Dave Scott...certo?

Anônimo disse...

Bonito o texto... Nota 10. O Max só precisa cuidar um pouco mais dos clientes respeitando-os como triatletas, e não como trouxas, se aproveitando deles ao deixarem algum dinheiro em sua loja e não os vendo nunca mais...

ciro violin disse...

Alexandre... muito boa sua observação:
Se formos ver o resultado do Ironman do Hawaii de 1980 realemte o Dave Scott ganhou esta prova com 9h24.
Mas não sei se o Max, autor do texto, esta referindo a uma outra prova de IronMan na mesma data.

Anônimo disse...

Cirão!!!
Belo texto.
E você, já tá treinando?
Coloca os treinos no Blog

Max disse...

Alexandre, Ciro;

vcs. tem razão, o tempo foi de Dave Scott. Depois de enviar o texto eu percebi a mancada e mandei uma errata, mas já era tarde.

Anônimo,

seu texto me deixou confuso. Vc. "deixou" dinheiro na minha loja...isso quer dizer que esqueceu dinheiro lá e não lhe devolvi? Vc. diz também que eu "me aproveitei de você....e depois....não o vi nunca mais". Essa parte realmente é complicada!

Vamos fazer o seguinte: prometo devolver seu dinheiro, reparar o mal que lhe fiz, e tentar ver você sempre que possível. Em troca, você coloca seu nome (verdadeiro) no próximo post, e conta melhor essa his(es)tória. Caso contrário, darei o assunto por encerrado, e ao menos para mim você de anônimo passará a ser interpretado com o covarde.

Valeu!